Em uma entrevista exclusiva ao Jornal de Angola, a Representante Residente do PNUD em Angola partilha insights sobre as acções realizadas ao longo dos anos, os desafios enfrentados e os resultados alcançados na colaboração com o Governo angolano e outras instituições.
Entrevista Denise António - Jornal de Angola
6 de January de 2025
Na busca por um desenvolvimento sustentável e inclusivo, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) tem desempenhado um papel fundamental em Angola desde 1977.
Em uma entrevista exclusiva ao Jornal de Angola, a Representante Residente do PNUD em Angola partilha insights sobre as acções realizadas ao longo dos anos, os desafios enfrentados e os resultados alcançados na colaboração com o Governo angolano e outras instituições.
A conversa destaca a importância da erradicação da pobreza, da promoção da igualdade de género, e da construção de uma economia diversificada e resiliente, além de abordar as iniciativas do PNUD para enfrentar as mudanças climáticas e fortalecer as capacidades locais.
À medida que Angola se aproxima dos objectivos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, esta entrevista oferece uma visão abrangente das estratégias e dos compromissos do PNUD em prol do progresso social e económico do país.
O PNUD está presente em Angola desde 1977, 12 anos depois da fundação da Agência pelas Nações Unidas. Que balanço faz das acções até aqui realizadas?
Ao longo dos anos, a parceria entre o Governo de Angola e o PNUD tem evoluído significativamente, tanto em termos de objectivos como de impacto.
Inicialmente, o nosso trabalho centrava-se na desminagem para garantir a segurança das comunidades após o conflito. Actualmente, esta parceria aborda prioridades mais abrangentes centradas no crescimento económico inclusivo e na criação de emprego/empreendedorismo, no fortalecimento dos sistemas de saúde, na protecção do ambiente, na resposta ao impacto das alterações climáticas e apoio a uma governação forte e democrática.
Estes esforços reflectem o compromisso contínuo do PNUD em contribuir para que Angola seja uma nação resiliente e sustentável e tenha uma melhor qualidade de vida para todo o seu povo.
De que forma o PNUD coopera com o Governo angolano e outras instituições para a erradicação da pobreza, desigualdade e exclusão social?
O PNUD trabalha em estreita colaboração com o governo, instituições financeiras internacionais, parceiros do sector privado, parceiros de desenvolvimento e organizações da sociedade civil para responder aos desafios de desenvolvimento de Angola.
Juntos, concentramo-nos em iniciativas que promovem e criam oportunidades económicas, apoiam a transição de economias informais para formais, melhoram o conhecimento para promover o acesso à inclusão financeira e expandem o acesso à tecnologia digital. No domínio dos cuidados de saúde, contribuímos para garantir o acesso e a prestação de serviços equitativos e de qualidade, em especial às mulheres, aos jovens e às comunidades marginalizadas. O nosso trabalho também engloba a promoção da igualdade de género e o apoio a sistemas de governação que dão prioridade à governação baseada nos direitos humanos.
Que resultados foram já alcançados no quadro dessas parcerias?
Ao longo dos anos, as nossas parcerias têm produzido resultados significativos. Para destacar alguns, o trabalho que desenvolvemos no período inicial em matéria de desminagem transferiu tecnologia vital para instituições nacionais como o INAD e o CNIDAH, permitindo-lhes tornar as comunidades mais seguras e recuperar as áreas afectadas.
Na área da saúde, através do investimento do Fundo Global de mais de 400 milhões de dólares, o PNUD apoiou Angola na sua luta contra o VIH, a malária e a tuberculose, beneficiando milhões de pessoas com uma melhor qualidade de vida. Também atribuímos bolsas de estudo a jovens nas províncias de Luanda e Huíla, para desenvolverem as suas competências para o futuro.
Além disso, em colaboração com os governos provinciais, estamos a proporcionar acesso a energia limpa através de sistemas solares para comunidades em pelo menos 4 províncias, ao mesmo tempo que capacitamos mulheres e jovens empreendedores.
Estes são apenas alguns exemplos de como estamos a trabalhar para promover a diversidade económica, a inclusão e a sustentabilidade em Angola.
Como o Documento do Programa do País (CPD) 2024-2028 do PNUD se alinha com as prioridades de desenvolvimento nacional de Angola e com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)?
O Documento de Programa Nacional (CPD) 2024-2028 do PNUD está estreitamente alinhado com o Plano Nacional de Desenvolvimento de Angola, centrado no capital humano e na segurança alimentar, bem como nos quatro pilares (Pessoas, Paz, Prosperidade e Planeta) do Quadro de Cooperação para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.
Estas áreas contribuem diretamente para o acesso equitativo aos serviços, a governação democrática, o crescimento económico sustentável e a gestão responsável dos recursos naturais. Todos estes aspectos foram concebidos para fazer avançar o progresso de Angola em direção aos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Como o PNUD em Angola trabalha para reforçar as capacidades das pessoas e apoia o fortalecimento e a resiliência da sociedade angolana?
O nosso foco para uma Angola resiliente inclui o desenvolvimento de capacidades locais para que as comunidades, particularmente as vulneráveis, possam localmente adaptar as suas soluções ao contexto dos seus desafios, por exemplo, fornecemos formação a mais de 39.000 empresários informais em literacia financeira e competências digitais, assim como apoio aos pescadores artesanais através do Programa de Reconversão da Economia Informal (PREI).
Outros incluem o nosso programa Kurima, que visa capacitar os jovens, especialmente as raparigas, nas zonas rurais, proporcionando-lhes acesso à conetividade e a ferramentas digitais.
Através do financiamento do Banco Europeu de Investimento, também apoiámos o Governo de Angola para garantir mais de dois milhões de doses de vacinas contra o cancro do colo do útero para as jovens.
No domínio da governação, apoiámos a criação de 260 Comités Locais de Direitos Humanos em todo o país, bem como a sensibilização para o orçamento participativo a nível local, a fim de amplificar as vozes das comunidades nas suas prioridades de desenvolvimento local.
Que parcerias concretas existem entre o PNUD e o Estado angolano?
Cooperamos diretamente com vários ministérios e instituições públicas de diversos sectores. Por exemplo:
O Ministério das Relações Exteriores
Na Saúde, com o Ministério da Saúde.
No Desenvolvimento Económico, com o Ministério das Finanças, o Ministério do Planeamento, o Ministério da Indústria e do Comércio, o Ministério da Juventude e do Desporto, o Ministério do Turismo, o Ministério da Agricultura e das Florestas, o INE, o INEFOP, o INAPEM, a AGT, a AIPEX.
No domínio do ambiente, com o Ministério do Ambiente, o Ministério das Pescas e dos Recursos Marinhos
Na Governação, com o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, Ministério da Administração do Território, Ministério da Defesa Nacional e dos Veteranos da Pátria, Ministério da Ação Social, da Família e da Promoção da Mulher, Provedoria de Justiça.
A redução da pobreza, continua a ser uma prioridade para o Governo angolano. Em que é que o PNUD contribui?
A erradicação da pobreza exige um esforço coordenado e colectivo para o qual o contribuímos como parte de um esforço colaborativo muito maior que inclui todas as partes interessadas para além do governo. Por conseguinte, a intervenção do PNUD estende-se a vários sectores e agentes nos domínios da saúde, da diversificação económica, da gestão dos recursos naturais e da governação inclusiva, assegurando que ninguém é deixado para trás.
Até que ponto o acesso à saúde e outros serviços básicos, bem como a descentralização das estruturas de governação pode contar com o apoio do PNUD?
O PNUD tem vindo a fazer isto através das 4 áreas prioritárias ((diversificação económica sustentável, acesso equitativo a serviços sociais de qualidade, gestão dos recursos ambientais e naturais, governação democrática eficaz e inclusiva) das nossas intervenções em colaboração com o Governo.
O PNUD é o principal recipiente (PR) dos subsídios do Fundo Global para o VIH em Angola, sobretudo na implementação da subvenção para apoiar a resposta nacional ao VIH/sida. Qual é a avaliação que faz do quadro epidemiológico nacional?
Embora Angola se depare com desafios significativos em relação a doenças como a tuberculose e a malária, a prevalência do VIH permanece relativamente baixa em comparação com outros países da África Austral.
Estes indicadores continuam a moldar o nosso trabalho, uma vez que a necessidade de serviços de saúde robustos continua a ser crítica. Em parceria com o Ministério da Saúde, o PNUD desempenhou um papel fundamental na garantia de aproximadamente 126 milhões de dólares para o ciclo de financiamento do Fundo Global 2024-2027 (GC7), um aumento significativo em relação ao ciclo anterior, para continuar a melhorar a prestação de serviços de saúde às pessoas que vivem ou são afectadas pelo VIH, tuberculose e malária nas províncias de Benguela, Cuanza-Sul e Bié.
Faltam, sensivelmente, cinco anos para o cumprimento da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e o progresso global, em mais de 50 por cento das metas dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) é fraco e insuficiente, sendo que em 30 por cento das metas, o mundo estagnou ou retrocedeu. Como é que Angola está em relação ao cumprimento das metas dos ODS?
Angola está actualmente a preparar o seu 2º Relatório Nacional Voluntário, a ser apresentado no Fórum Político de Alto Nível sobre Desenvolvimento Sustentável em 2025. Este é um documento fundamental para monitorizar e avaliar o progresso e os desafios em relação aos indicadores dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). O relatório fornecerá uma imagem mais precisa do progresso do país em relação aos ODS.
Utilizando um modelo para simular a trajectória futura dos ODS em diferentes cenários, o Governo de Angola e as Nações Unidas publicaram recentemente um estudo intitulado “Acelerando os ODS em Angola”, que indica a necessidade de um investimento adicional entre 2 e 5 por cento do PIB anual na saúde, educação, protecção social e acção climática, sectores“aceleradores” para os ODS. Uma das principais recomendações foi a necessidade de uma Estratégia de Financiamento dos ODS para o Desenvolvimento sobre a mobilização de recursos a nível interno e externo, bem como através de recursos públicos e privados.
Angola está a explorar como os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) podem ser alcançados por meio de políticas tributárias estratégicas ao introduzir o modelo pioneiro apelidado Quadro Tributário dos ODS (STF). Como esta ferramenta pode ser importante na arrecadação de impostos para a distribuição de riqueza dentro da sociedade, com vista à redução da pobreza e da desigualdade?
Desde 2022, o PNUD, em parceria com os Governos da Finlândia e da Noruega, lançou a Iniciativa de Impostos para os ODS para apoiar os países a melhorarem a mobilização dos recursos nacionais e a progredirem em direção aos ODS. O PNUD estabeleceu uma parceria com a AGT, através dos Inspectores Fiscais sem Fronteiras, para reforçar as suas capacidades em matéria de auditoria fiscal e arrecadação de receitas.
A iniciativa visa apoiar o país no alinhamento da sua política fiscal com os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, permitindo que os impostos cobrados financiem projectos com impacto social e económico.
Os dados recolhidos pelo Censo continuam sendo uma ferramenta indispensável para uma planificação e gestão do país?
Sim, os dados do Censo são fundamentais para um planeamento e uma elaboração de políticas eficazes. Fornecem informações detalhadas e actualizadas sobre a população e podem ser utilizados como um indicador das áreas onde são necessárias intervenções. A qualidade e a frequência destes dados, juntamente com a coordenação entre ministérios e departamentos, são essenciais para monitorizar o progresso e ajustar as políticas de forma eficaz.
Que iniciativas estão a ser implementadas para a igualdade de género e o empoderamento das mulheres, especialmente em áreas rurais?
Grande parte do trabalho do PNUD em Angola centra-se no empoderamento das mulheres, na igualdade de género e no desenvolvimento rural, uma vez que estes são factores críticos para um crescimento sustentável e inclusivo. As mulheres, especialmente nas zonas rurais, enfrentam desigualdades significativas, desde o acesso à educação, aos cuidados de saúde, ao financiamento e às oportunidades económicas, apesar de serem vitais para a produção agrícola e a economia informal de Angola.
Ao integrar as mulheres em todas as iniciativas, como a resiliência climática, a economia azul e o empreendedorismo em pequena escala, o PNUD contribui para melhorar os seus meios de subsistência e reforçar a adaptação da comunidade aos choques ambientais e económicos.
Os investimentos direccionados para as áreas rurais potenciam benefícios sociais mais amplos, garantindo que ninguém é deixado para trás e posicionando particularmente as mulheres e os jovens como agentes de transformação na jornada de Angola em direcção ao desenvolvimento sustentável e inclusivo.
Diante dos desafios globais da mudança climática, como o PNUD está a enfrentar estas questões, como as secas, inundações e a gestão sustentável dos recursos naturais em Angola?
Apoiamos a estratégia de açcão climática de Angola e ajudamos a garantir financiamento internacional para iniciativas no domínio da biodiversidade e das alterações climáticas.
Algumas das nossas intervenções incluem o Plano Estratégico para a Bacia Hidrográfica do Cubango-Okavango; a promoção da produção sustentável de carvão vegetal, que resultou numa redução de 50 000 toneladas de emissões directas de gases com efeito de estufa; a expansão o acesso a energia limpa; e o combate do comércio ilegal de animais selvagens, criando áreas marinhas protegidas e contribuindo para a proteção ambiental e a resiliência das comunidades.
O Laboratório de Aceleração é uma iniciativa inovadora do PNUD presente em 114 países para impulsionar soluções para os desafios de desenvolvimento sustentável em contextos locais. Qual é o papel do Acc Lab em Angola e que resultados significativos foram alcançados até agora por esta iniciativa?
O Laboratório de Aceleração do PNUD em Angola está a promover a inovação para fazer face aos desafios do desenvolvimento local.
Por exemplo, com o Ministério da Administração Territorial, lançámos o primeiro laboratório de ideias de Angola, o MATLAB, para apoiar soluções baseadas na comunidade. O Laboratório também promoveu iniciativas de energia renovável e inclusão digital em áreas rurais, para melhorar as competências e os meios de subsistência para o futuro.
Recentemente, em novembro, o Laboratório lançou a sua primeira campanha pioneira de financiamento colectivo para mobilizar recursos para a instalação de cozinhas solares em comunidades rurais de todo o país.
Como o PNUD está a abordar os desafios da diversificação económica em Angola? Que acções específicas estão a ser implementadas para fortalecer as capacidades locais e garantir que o crescimento económico inclua todos os segmentos da sociedade, em particular os mais desfavorecidos?
O PNUD em Angola tem vindo a abordar os desafios da diversificação económica através de uma estratégia abrangente e alinhada com o Plano Nacional de Desenvolvimento de Angola e os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
A capacitação das micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) é um elemento central da nossa acção através da assistência técnica e financeira para impulsionar o empreendedorismo, a inovação e a criação de emprego em todos os sectores. Simultaneamente, a formação profissional e os programas de emprego para jovens, realizados em colaboração com o INEFOP, capacitam os jovens com competências para as indústrias emergentes. Estes programas também promovem o empreendedorismo através de orientação e incubação, com especial destaque para os jovens e as mulheres.
Promovemos a economia azul em Angola, ao apoiar iniciativas sustentáveis como a pesca, a aquacultura e os serviços marítimos. Estes esforços reforçam as capacidades das comunidades de pescadores artesanais, promovendo práticas sustentáveis que garantem a produtividade e a segurança alimentar a longo prazo.
Além disso, contribuímos para que o governo reforce a governação económica, desenvolvendo quadros políticos para atrair o investimento direto estrangeiro em indústrias diversificadas e melhorando os sistemas de gestão das finanças públicas para alinhar os recursos com as prioridades de diversificação.
As energias renováveis e os empregos verdes também ocupam um lugar de destaque no trabalho do PNUD. Os projectos nas zonas rurais têm expandido o acesso a energia limpa e a preços acessíveis, criando simultaneamente empregos verdes no domínio da energia solar e da conservação do ambiente.
O desenvolvimento com inclusão do género é outro pilar fundamental, com programas destinados a capacitar as mulheres através de formação, acesso ao crédito e oportunidades de liderança em sectores não tradicionais, assegurando a sua participação activa no empreendedorismo e nos processos de tomada de decisões.
O PNUD facilita parcerias com doadores internacionais, actores do sector privado e governos locais para impulsionar a inovação e mobilizar recursos. A partilha de conhecimentos e a cooperação Sul-Sul são fundamentais para a adoção das melhores práticas dos países que estão em transição para economias dependentes de recursos.
Além disso, o PNUD investe na transformação digital, apoiando a formação de competências digitais, permitindo que a força de trabalho de Angola participe na crescente economia digital global e incentivando o crescimento de startups tecnológicas e plataformas de serviços digitais.
Através destes esforços integrados, o PNUD Angola está a reduzir a dependência do país em relação ao petróleo, a criar oportunidades económicas inclusivas e a criar resiliência aos choques económicos globais, abrindo caminho para uma economia mais diversificada e sustentável.
Em parceria com o Governo, algumas acções específicas resultaram em: - Formalização de 253.048 novos microempresários informais de 2022 a 2023; - Formação de 1233 indivíduos (60% mulheres) em gestão florestal sustentável e tecnologia de carvão vegetal; - Formação em literacia financeira, inclusão digital e género para mais de 50 000 empresários e representantes de organizações da sociedade civil; - Sensibilização e orientação sobre os benefícios da formalização das suas empresas para mais de 9 800 mulheres; - Promoção de oportunidades de investimento para startups através de programas inovadores, como o Meet the Tôshikas e o PNUD Timbuktoo FinTech.Denise António, RR do PNUD Angola